1. Escreve para ti
Talvez não seja possível responder à pergunta clássica: «Porque se começa a escrever?».
Podemos, no entanto, inverter as coisas: «Nunca deve começar a escrever se…».
– Está preocupado com a opinião alheia;
– Precisa de ter «um trabalho sério»;
– Não tem nada para dizer.
Escrevemos porque sim. E escrevemos para nós. Se os outros gostam, é secundário. Se os outros não gostam, é secundário. Se formos publicados, é secundário. Se não formos publicados, é secundário. O objectivo é escrever.
2. Aprecia a Viagem
Como tudo o que é realmente importante na vida, o segredo não está na velocidade.
Descurarmos o cuidado que colocamos no trabalho não é sinal de brilhantismo. Significa displicência e arrogância. E quase sempre, reprovação.
Em muitos aspectos é como estar na cozinha. O pré-embalado, pré-cozinhado, pronto a servir pode resolver a vida dos ociosos, mas será prejudicial a longo prazo. O tempo e concentração que gastamos com cada ingrediente (enredo, personagem, cenário), será evidente no paladar final.
3. A Magia está no Detalhe
Um dos piores inimigos de uma boa história é uma escrita preguiçosa. Literatura não é Cinema. Não basta dizer: «O herói saltou e derrotou o inimigo. Os amigos aplaudiram, a mulher bonita abraçou-o». Um filme assim filmado é um mau filme. Um livro assim escrito é ilegível.
E bem sabemos como estamos fartos de livros ilegíveis.
4. Demonstrar sem Dizer
Este aspecto está de certa forma ligado ao anterior. Escrever dá trabalho. Muito trabalho.
Devemos esperar que o leitor seja solidário com isso. Que se esforce o mínimo indispensável. Que pense. Que se interrogue. Que conclua. Que imagine. Que arrisque. Que acerte. Que falhe.
5. Ler e Reler. E Reler
Ninguém escreve sem ler o que outros escreveram antes de nós.
Há que ler uma primeira vez para sabermos onde estamos, e uma segunda para sabermos onde realmente estamos. Por fim, uma terceira, para confirmar que não fomos parar a outro sítio.
Como afirmou Woody Allen, «se tiveres de te inspirar nos outros, inspira-te nos melhores».
Para sabermos quem são, há que lê-los. Ler muito.
E depois, ler mais uma vez.
6. Aberto ao Mundo
Por mais rebuscada que seja a forma de escrita, esta só é possível se retirada de qualquer lado. Por mais leve que seja, é essencial fazer investigação.
Se falarmos de uma doença, se descrevermos um acidente, se arquitectarmos uma discussão acesa ou um diálogo enamorado, teremos de utilizar todos os meios para que tal seja credível.
Nada nos obriga a fazer constantemente «trabalho de campo» ou a desarrumar as estantes nas bibliotecas. Basta estarmos um pouco mais atentos do que o cidadão comum.
Questionarmos, ainda que essas questões nunca abandonem o silêncio da mente.
7. Escrever e Reescrever. E depois, Rever
O mito: «Encarei a folha em branco à espera da musa».
Aparentemente, algo virá não se sabe bem de onde e a história «escrever-se-á sozinha».
Sem plano, sem estrutura, «ao sabor da pena».
A diferença entre os amadores e os profissionais é que os segundos mergulham num longo e moroso processo de revisão. Até à versão final, existem dezenas de «rascunhos».
Outros, quando começam a escrever, já têm na cabeça o esqueleto do texto. Enchê-lo de carne e pele, torna-se infinitamente mais simples.
Contudo, o que surge tem sempre de ser considerado um ensaio. Que se edita superficialmente, parágrafo a parágrafo, durante o processo. Que se reedita no fim do dia. E que se edita uma terceira vez (pelo menos), depois de concluído o livro.
Se deixarmos passar algum tempo, somos normalmente prisioneiros deste fenómeno: de cada vez que se relê, reedita-se. Cabe a cada um abandonar o processo na altura adequada.
8. Lidar com a Rejeição
Se obedecermos ao ponto um, este resolve-se sem esforço.
Todavia, acabamos inconscientemente por escrever para alguém. A fraqueza humana dita que estejamos dependentes da comunicação, que passa pela reacção alheia à nossa mensagem.
Família e amigos são um público fácil, porque nos apoiam sempre, quer gostem quer finjam gostar. Outros, porém, irão criticar a «criança-livro», o que é sempre custoso, mesmo que tenham razão. Sobretudo quando têm razão.
Existem duas fases. Quando o ego nos impele a mostrar um produto inacabado, todas as críticas são mais do que bem-vindas. Cumprem o papel do doloroso tratamento que irá, por fim, curar a doença. Por outro lado, se dispensámos o tempo e esforço suficientes para criar um produto profissional, as primeiras portas fechadas poderão ser uma desilusão e desmotivar alguns ao ponto da desistência.
É uma lei da vida. Muitas coisas boas ficam na sombra e muitas coisas más recebem elogios injustos. A escrita não está fora deste paradigma.
É obrigatório perceber quem, quando, porquê, como, rejeitou ou criticou o texto. Muitas vezes, essa rejeição pode não estar em nada relacionada com a sua qualidade. O que é um princípio.
A lista de dificuldades é longa, mas a lista de opções também. Desistimos quando estivermos mortos. Isto para não falar de todos os casos de autores publicados postumamente.
9. Aprender com os Outros
Todos os génios cometeram erros. Todos tiveram dúvidas, hesitaram, riscaram frases, rasgaram papel. Muitos consideraram-se indignos até ao fim dos dias, alguns chegaram ao extremo do suicídio. Outros pediram aos sobreviventes para destruírem tudo o que fora feito, convictos que não tinham qualidade.
A informação está hoje muito mais acessível e tudo o que as gerações anteriores fizeram (bem e mal) está lá para ser descoberto e analisado. Não há segredos. Imitar o positivo e evitar o negativo.
10. Não desistir. Agora a sério: Não Desistir
Desistir é escandalosamente fácil.
Olhamos para os rabiscos de infância e gargalhamos com a inocência. Recordamos os rabiscos da adolescência e sorrimos com a inocência. Na faculdade, temos demasiado que estudar e demasiado que fazer, ainda que muito do que se fez hoje em dia não tenha grande importância. Ou então começamos a trabalhar demasiado cedo, demasiado cedo com horários, com responsabilidades, com prisões e desilusões. A vida manipulará e subverterá de forma permanente toda a nossa energia e disponibilidade.
Se por qualquer milagre conseguirmos escapar disto, convém saber o que fazer, durante quanto tempo, como e porquê. Ao acabarmos o primeiro livro, teremos de começar o segundo, e depois do segundo terá de vir o terceiro, pois são muitos os autores que escondem diversos manuscritos nas gavetas. Para cada um deles, de acordo com o tamanho e complexidade, será muito difícil dispensar menos de um ano.
Portanto, depois de um longo período a procurar obter as condições ideais para um trabalho sério e de mais alguns anos (muitos, conforme o número de livros planeados) a ser disciplinado nesse trabalho (evitando horários desencontrados, distracções familiares, saídas nocturnas, ataques de letargia, desinspirações, entre outros engulhos), teremos ainda de lidar com a muito forte possibilidade de nunca vermos os nossos textos aprovados.
A cereja no topo do bolo é a dita publicação. São incontáveis os autores amargamente arrependidos de tal estatuto e devemos investigar porquê.
A conclusão é só uma: Temos de ser completamente loucos para fazer isto.
Por outro lado, a sanidade serve para quê?