
© Pedro Teias
Há poucos dias, voltaram a confidenciar-me o sonho de trabalhar numa livraria.
De cada vez que isto me acontece, não consigo evitar aquele sorriso condescendente de quem já sonhou o mesmo e viveu esse sonho até ao ponto de o desmistificar.
Se todos partilharmos a mesma imagem, o idílio de «trabalhar numa livraria» deve ser algo aproximado ao que se exibe no cinema, onde um charmoso e romântico espaço de esquina, inserido numa rua florida de um bairro tradicional, alberga em montras imaginativas e estantes altíssimas, impregnadas pelo perfume da madeira velha, todo um oceano de livros, desordenadamente arrumados. É um espaço onde todos encontram o que procuram, entram e saem com sorrisos estampados, as vendas nunca diminuem embora o trabalho seja reduzido, feito em ritmo de passatempo, o pó é inexistente ou bem-vindo, fazendo parte do livro sem se tornar um incómodo. As prateleiras estão sempre repletas, os livros pedidos estão sempre disponíveis, as encomendas nunca chegam tarde e a más horas, muito menos quando temos a casa cheia. Os livros saltam dos caixotes munidos de asas e arrumam-se sem esforço pela ordem desejada, seja alfabética, temática, ou outra. O horário é fantástico, cinco ou seis horas de prazer laboral. Não há roubos, nem medidas de segurança.
O livreiro (nós) é uma espécie de Deus. Sabe tudo sobre todos os livros do passado, presente e futuro, encontra o que procura sem esforço, agrada a todos, alivia os idosos da solidão, faz amizades com facilidade, encanta as mulheres. Não existem maus clientes.
É por isto que todos querem trabalhar em livrarias.
Os que por lá passaram, como eu, toleram a inocência.