Autores Uruguaios – Juan Carlos Onetti

imagesViveu entre 1909 e 1994.

A escritora uruguaia Cristina Peri Rossi considera que Onetti é «um dos poucos existencialistas em língua castelhana». Mário Vargas Llosa afirmou numa entrevista que Onetti «é um dos grandes escritores modernos», e não só da América Latina. «Não teve o reconhecimento que merecia como um dos autores mais originais e pessoais, que introduziu a modernidade na literatura narrativa. O seu mundo é muito mais pessimista, carregado de negatividade e isso faz com que não chegue a um público mais vasto. Onetti é um escritor extremamente original, coerente, que supera o pessimismo da sua existência através da literatura».

Nasceu em Montevideu, a 01 de Julho de 1909. Teve dois irmãos. Em 1930 casou-se com uma prima, Maria Amália Onetti. Em Março do mesmo ano o casal mudou-se para Buenos Aires. A 16 de Junho de 1931 nasce o primeiro filho: Jorge Onetti Borges, também escritor e falecido em 1998. Em 1933, separa-se da mulher e um ano depois regressa a Montevideu, casando-se com outra prima, Maria Júlia Onetti, a irmã de Maria Amália.

Em 1939, trabalha para o semanário Marcha. Nessa altura interessa-se por Artes Plásticas, como se pode ler na correspondência que troca com amigos. A partir de 1941 começa a trabalhar na agência de notícias Reuters. Nesse ano, apesar de manter o trabalho, regressa a Buenos Aires, onde ficará até 1955. Trabalha para várias revistas e em 1945 volta a casar-se com uma colega de trabalho da Reuters, a holandesa Elizabeth Maria Pekelharing. A 26 de Julho de 1949 nasce a filha de ambos.

Em finais de 1955 regressa a Montevideu e começa a trabalhar para o diário Acción; casa-se pela quarta vez com uma jovem argentina de ascendência alemã, Dorothea Muhr.

É preso em 1974, durante a ditadura uruguaia, e chega a ser internado num hospital psiquiátrico. Amigos e colegas unem-se para conseguir a sua libertação e assim que pode viaja para Espanha, fixando por fim residência em Madrid até à morte. Nesta fase, encontra condições para continuar a escrever, produzindo três romances. Nos artigos que escreve em Espanha, onde foi bem recebido, está muito presente a preocupação com o exílio latino-americano.

Quando a democracia regressa ao Uruguai, em 1985, o presidente eleito Júlio Maria Sanguinetti convida-o para as cerimónias de tomada de posse, mas Onetti, apesar de grato, opta por permanecer em Madrid.

Morre a 30 de Maio de 1994, numa clínica madrilena, na cidade onde viveu 19 anos, tendo ficado acamado os últimos cinco.

A obra literária de Onetti, apesar de profundamente original, tem duas importantes influências. A primeira é William Faulkner. Tal como este, Onetti cria um mundo autónomo, cujo centro é a cidade fictícia de Santa Maria. A segunda é o movimento do Existencialismo: existe uma angústia profunda em cada um dos seus livros, sempre íntimos e sem esperança. O primeiro romance, El pozo, de 1939, é considerado o primeiro romance moderno da América do Sul. O ciclo de «Santa Maria» começa em 1950, com La vida breve, que juntamente com El astillero e Juntacadáveres formam uma espécie de trilogia.


450xNEscrito em 1961, é considerado a sua obra-síntese.

O enredo é simples. «Santa Maria» assiste ao regresso de um tal E. Larsen, o Junta Cadáveres do livro seguinte, que tinha sido expulso da cidade ao tentar abrir um bordel.

A troco de um salário que oscila entre cinco e seis mil pesos, Larsen aceita ser o gerente de um estaleiro em ruínas, propriedade de um magnata falido, tendo ao seu serviço dois directores inúteis. É esta equipa que passa a frequentar o estaleiro corroído pelo tempo, onde todos fingem capacidades profissionais que disfarçam o facto de não fazerem rigorosamente nada.

O cenário desolado daquele cais conta ainda com um albergue decadente, um bar, e algumas mulheres fantasmagóricas. Por vezes ficamos com a sensação de estar num cenário do Oeste Americano, rodeados de nomes bizarros como Kunz, Larsen ou Petrus.

A atmosfera recheada de Absurdo é passível de perturbar o leitor que tente criar empatia com a história ou personagens.

O narrador é uma espécie de voz do povo, feita de uma omnisciência ambígua: «Não se sabe como chegaram a encontrar-se Petrus e Larsen» ou «Suspeitou, de repente, o que todos acabam por compreender mais cedo ou mais tarde – era o único homem vivo num mundo ocupado por fantasmas».

A estranheza é suportada através do uso da linguagem e é através dela que se ergue um mundo hostil, tenebroso, inacessível, quase inexplicável, uma sociedade desprovida de indivíduos, cujas vontades são sopros sem comando.

A certa altura, Larsen pensa nos «actos ainda desconhecidos que começaria a executar, um após outro, sem paixão, como se apenas emprestasse o corpo».

A magnífica imagem de um imenso estaleiro em ruínas, sob as ordens de funcionários que fingem viver a plenitude de um trabalho, leva-nos por momentos a pensar numa alegoria, ao estilo da obra simbólica, mas o narrador arranca-nos a essa interpretação tranquilizadora (a decadência latino-americana transformada em fábula poética), devolvendo-nos ao mundo prosaico das causas e dos efeitos.

Larsen justifica-se imaginando que, assumindo o cargo fictício, ganhará no futuro a sua quota parte do espólio, supostamente sempre a poucos dias de se resolver juridicamente, assim que o antigo milionário industrial salde as dívidas.

No fundo, ninguém acredita nisso, uma vez que ninguém acredita em coisa nenhuma, mas são todos incapazes de verbalizar a descrença. Enquanto isso, vendem a sucata do estaleiro a russos misteriosos (associação inevitável à Guerra Fria) e partilham lucros miseráveis que lhes permite sobreviver numa base apenas diária.

Um dos directores exibe como um talismã um falso título, assinado pelo ex-magnata, que a ser usado, destruiria para sempre o sonho do renascimento.

O «sentido lógico» da narrativa é aquilo que a torna ainda mais absurda e é esse o desejo do autor, mestre do pessimismo radical, que é para ele, o único ponto de contacto com a realidade.

 

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