O filósofo austríaco Wittgenstein, a propósito da linguagem, criou uma metáfora. Em poucas palavras, pedia ele para imaginarmos um grupo de pessoas, cada uma delas com uma caixa, cada caixa contendo um escaravelho. Contudo, nenhum pode ver o que está nas restantes caixas e cada um tem uma ideia muito própria do que é um escaravelho. Assim sendo, cada caixa pode ter uma coisa diferente: um insecto ou não, um objecto ou não e em última análise, uma das caixas ou todas elas podem até estar vazias. Porque segundo o dono daquela caixa, que não tem qualquer prova em contrário e nunca viu realmente um escaravelho, o que «está» dentro da caixa, ainda que seja o vazio, «é» um «escaravelho».
Modestamente, penso que esta alegoria, criada e utilizada apenas para definir conceitos de linguagem, pode ser estendida a outros campos de análise.
Se for comunicado a um indivíduo que na sua «caixa» ou corpo pode encontrar um conjunto de emoções e a cada uma delas for atribuída uma significação, esse indivíduo passará a saber designar «amor», «ódio», «dor» e assim por diante. Se devido a uma «falha» de percepção o tal indivíduo fugir à maioria, interpretando erroneamente uma das significações (confundindo «amor» com «ódio», por exemplo), para esse sujeito em particular, «amor» será algo diferente. Nem por isso menos válido.
Se for comunicado a uma determinada população que as normas de conduta e funcionamento da sociedade passam por um conjunto de acções e consequências, a ausência de outro exemplo fará com que cegamente se admita que o modo A é o modo «certo», em oposição com o modo B, que é o modo «errado». Aos indivíduos que por alguma razão desenvolvam outras significações para as mesmas acções, será atribuída uma rotulagem defeituosa, por diferente da maioria.
Se por «maioria» interpretarmos «aqueles que detêm o poder» estaremos quase sempre num lugar «seguro». Apesar de um ou outro indivíduo já ter, por mero acaso, visto o verdadeiro escaravelho.