Nasceu no Rio de Janeiro, em 1966.
A vida de imediato o levou para Belém, capital do estado do Pará, situado no Norte do Brasil. Foi nessa cidade que se licenciou em Direito (1989) e depois em Letras (1997), com habilitação em Língua Alemã. Fez ainda uma pós-graduação em Língua Portuguesa e Análise Literária, pela Universidade do Estado do Pará (2003).
Ao longo dos anos tem alternado o Ensino, a Advocacia e a Escrita.
Em 2007 venceu o Prémio Carlos Drummond de Andrade (poesia) e foi ainda finalista do Prémio Machado de Assis (contos).
Entre poesia, romance, contos, crónicas e literatura infantil-juvenil, o autor tem dezasseis livros publicados, quase todos a partir de concursos e prémios literários.
Já em 2014, lançou-se para o outro lado do Atlântico em busca de um Doutoramento em Estudos Comparatistas, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, estando agora à beira de completar esse processo.
Em 2017, Nuno Almeida, de quem falámos aqui, dedicou-lhe algumas palavras no seu blogue.
Avesso a publicidade, elogios ou holofotes, tem no entanto construído uma reputação serena mas firme no seu estado, tão próximo e tão ligado ao Amazonas – o gigante curso de água é uma presença indelével na vida e obra do autor.
O período em Lisboa foi marcado por uma busca incessante pelo silêncio, percursor de introspecção, criação literária e partilhas com amigos (velhos e novos). As únicas aparições públicas nasceram do apelo sedutor da poesia, ao qual deu eco nos Poetas do Povo ou no MusicBox. Exemplo disso, aqui.
O autor irá em breve regressar ao Brasil, continuando a conciliar a vida de advogado com a criação literária.
Falar desta obra é antes de mais recordar o que dela se diz aqui.
Ou pegar nas palavras de Marcílio Costa:
Aqui, temos uma experiência, um risco, valendo-se não da orientação mas da provocação de alguns autores que miravam algo para além da palavra a emoldurar sentimentos e sensações. Foi assim com Henri Michaux, Herberto Hélder, Max Martins, entre outros. É possível encontrá-los…
No entanto, e porque também tive a oportunidade de mergulhar em Aguarrás, eis o que encontrei dentro desse Oceano:
Outros o disseram e com eles concordo. O texto pode ser lido como um poema contínuo, ou enquanto salpicos individuais desse corpo. Essa pista parece estar logo na forma como se organizou o índice. Se na primeira metade os títulos ameaçam formar uma frase – pelo menos temática – na segunda esse exercício torna-se menos óbvio, remetendo para a especificidade de cada composição.
Atentem:
Primeira parte: espesso, memória, mútuo, fêmeo, náufrago, tempo, névoa, areia, deserto, solidão, flor(esta), dos teus lábios, áspera, limalha, vesúvio, narcose, sopro, húmus, terreno, borra, esgoto.
Segunda parte: lilith, lázaro, teu verbo, sépia, corrosão, ceia, alimento, cicatriz, marquise, restos, agora, espelho, a tua arte, acesa, voz, luz, esse corpo, ainda, grades, essa lápide, artesiana, linguagem.
O título, como melhor explica António Moura na introdução, remete para «o produto solvente», mas também para «o elemento químico utilizado na feitura de gravuras».
Ou seja, o autor quer desconstruir para reconstruir, de preferência melhor.
E o que se pretende desconstruir? Como já ficou bem claro, o Silêncio acima de tudo o resto, mas também o Mar, a Estética ou a Metafísica.
A Musa é certamente a linguagem:
língua, tu que sabes afiar a palavra, desbasta-me (…) nesse silêncio incapaz.
Depois, o convite ao mergulho:
um decapitado
sinos de silêncio
deserto à deriva
abismo
Esteticamente, os textos assemelham-se a quedas de água ou rios montanhosos, principiando no topo esquerdo da página para logo desaguarem no canto inferior direito. A espaços, surgem como constelações dispersas ou lagos nascidos no deserto do papel.
Tematicamente, se como já vimos, a maioria dos textos é fiel às ideias de introspecção, fechamento, mergulho e mesmo ocaso existencial, também espreitam boas provocações que apelam à revolução (mútuo, tempo, áspera, limalha, sopro…) ou ao amor (dos teus lábios, húmus, lilith, sépia…).
Ainda uma nota para certas experiências gráficas, que remetem – como se lê na introdução do livro – para uma «reflexão estética sobre o fazer poético».
Exemplos:
(…)
rosa dos ventos
veias
velas e cinzas
(…)
margem miragem
(…)
silêncio movimento cimento
(…)
ré, rédea e réu
(…)
relê
treslê
rês
(…)
Será possível definir Daniel da Rocha Leite (ou outro autor qualquer, já agora) através de um poema? Talvez não, mas arrisco este:
Terreno
Sou um ser em demolição
pedaços de paredes derrubadas
ferrugem da fé dentro das portas.
céus descascados
escombros
vísceras de silêncios
palavras roídas pelo cão das horas
ao lado, um anjo depena suas asas
ofereço casa, uma camisa emprestada.