Misto de despedida e celebração, sob a forma de um jantar em casa de amigos. Entre a memória de antigas formas de vida e a incapacidade de as experimentar como antes. Caminho quase sempre debaixo de um tiquetaquear interior, único sinal desse relógio etário que nunca se atrasa. Como veria aquelas ruas, convites e possibilidades na década passada? E como as verei na próxima? Como seriam as coisas se não fossem simplesmente como são?
O jantar é feito de pessoas a viver essa tal década que por mim já passou. Comem metade do que hoje careço e bebem o dobro do que hoje tolero. Porém, só aceito essa premissa bem depois de tudo ser irremediável. Depois dos risos e dos brindes, da música e das fotografias, das conversas e dos cigarros. Das novas garrafas que se abrem, das gargalhadas que aumentam e do calor que cresce.
Recordo-me pouco de como cheguei a um clube ou discoteca demasiado parecida com as que frequentava há 15 anos. Continuam a chegar cervejas e a desaparecer notas. A determinada altura, torna-se estranhamente difícil encontrar o caminho dos lavabos. Cumprida essa missão, sou emboscado por um degrau traiçoeiro, ou pela pouca percepção que dele tive, evitando um acidente feio por mero acaso.
É quase sempre assim que os acidentes se evitam ou acontecem. Por Acaso.
Encolhido num recanto, sinto-me mergulhado na cápsula do tempo que me permitiria fazer as coisas que hoje em dia já não me interessam.
Procuro reentrar no presente, voltando a casa, mas as curvas do táxi atiram-me de novo para um tempo em que a noite terminava em convulsões digestivas.