Boris Vian

Viveu entre 1920 e 1959. Revelou-se multitalentoso, desdobrando-se enquanto escritor, poeta, músico, cantor, tradutor, crítico, actor, inventor e engenheiro, embora tivesse ficado conhecido sobretudo pelos seus romances. Publicou alguns com o pseudónimo Vernon Sullivan, que foram considerados estranhas paródias do romance policial e extremamente polémicos à data da publicação.

Os restantes trabalhos, publicados em nome próprio, exibiram um estilo de escrita muito particular, com destaque para numerosas palavras inventadas, subtis jogos de significados e enredos surrealistas.

Destes, o romance mais conhecido é A Espuma dos Dias.

Vian foi também personagem de relevo no circuito do jazz francês. Introduziu, por exemplo, nomes como Hoagy Carmichael, Duke Ellington e Miles Davis em Paris, escreveu artigos para várias publicações francesas da especialidade (Le Jazz Hot, Paris Jazz) e abordou o tema de forma frequente quer na imprensa americana, quer na francesa. Obteve ainda algum sucesso com a sua própria música, enquanto foi vivo, com destaque para a canção antiguerra «O Desertor».

 

Boris Vian nasceu em 1920 no seio de uma família de classe média-alta, que habitava no luxuoso subúrbio de Ville d’Avray (Hauts-de-Seine). Filho de Paul Vian, um jovem rendeiro e de Yvonne Ravenez, pianista e harpista amadora. O pai transmitiu-lhe desde cedo o desagrado pelas instituições religiosa e militar, em contraste com o apreço pela vida boémia. Boris era o segundo de quatro filhos, sendo os outros Lélio (1918–1984), Alain (1921–1995) e Ninon (1924–2003). Habitavam uma propriedade conhecida como Les Fauvettes. O nome «Boris» foi escolhido pela mãe, ávida apreciadora de música clássica, depois de assistir à encenação de uma ópera de Mussorgsky, intitulada «Boris Godunov».

No final da infância, debateu-se com problemas de saúde, já que aos 12 anos contraiu febre reumática. A partir desta altura, os pais tornaram-se excessivamente protectores, comportamento que o autor mais tarde criticaria com bastante severidade nas obras «A Erva Vermelha» e «O Arranca-Corações».

Entre 1932 e 1937, Vian estudou no Lycée Hoche, em Versailles. Em 1936, associado aos dois irmãos, começou a organizar o que eles chamavam de «festas-surpresa». Estas consistiam essencialmente no consumo de mescalina, através de um pequeno cacto de origem mexicana chamado «peyote». Tais reuniões transformaram-se depois na base para o enredo dos primeiros romances, em especial «Vercoquin e o Plâncton», publicado em 1943/44. Ainda no ano de 1936, ganhou interesse pelo jazz e no ano seguinte começou a tocar trompete, juntando-se ao Hot Club francês.

Em 1937, concluiu os estudos secundários, sendo aprovado nos exames de Matemática, Filosofia, Latim, Grego e Alemão. Seguiu então para o Lycée Condorcet, também em Paris, onde reforçou o estudo da Matemática até 1939. Em paralelo, mergulhou a sério no circuito francês do jazz, tendo por exemplo ajudado a organizar, nesse mesmo ano, o segundo concerto de Duke Ellington em França. Com o eclodir da II Guerra Mundial, Boris não foi aceite em nenhum ramo das forças armadas, devido à sua frágil condição de saúde. Inscreveu-se então na «École Centrale des Arts et Manufactures», em Paris e depois transferiu-se para a pequena cidade de Angoulême, acompanhando a relocalização da instituição de ensino, devido ao conflito.

Em 1940, Vian conheceu Michelle Léglise, com quem casou no ano seguinte. Esta deu-lhe lições de Inglês e abriu-lhe as portas para a tradução de obras da literatura americana. Nesse mesmo ano, o autor conheceu Jacques Loustalot, logo transformado numa personagem recorrente dos primeiros manuscritos de Vian e conhecida como «O Coronel». Loustalot morreu acidentalmente em 1949, ao cair de um edifício que tentava escalar de modo a entrar num apartamento pela janela, no seguimento de uma aposta. Em 1942, Boris e os irmãos juntaram-se a uma orquestra de jazz, sob a batuta de Claude Abbadie, também ele transformado numa personagem secundária na obra «Vercoquin e o Plâncton». Ainda em 1942, o autor conclui os estudos na École Centrale, com diploma em Metalurgia e celebra o nascimento do filho, Patrick.

Após a graduação, o autor mudou-se com a mulher para um conhecido bairro de Paris, tendo-se tornado engenheiro da AFNOR logo em Agosto de 1942. Por esta altura, era já um trompetista respeitado nos círculos do jazz. Em 1943 surgiu o primeiro romance, a que se juntou um poema publicado numa revista do Hot Club no mesmo ano. Assinou este último com o nome «Bison Ravi», um anagrama de Boris Vian. É neste ano que ocorre a morte do pai, assassinado na própria casa por assaltantes.

No ano seguinte, Vian concluiu «Vercoquin e o Plâncton», um romance inspirado não só nas festas dos tempos de juventude mas também no trabalho de engenheiro na AFNOR (contexto bastante satirizado no enredo). Os amigos Raymond Queneau e Jean Rostand ajudaram-no a ser publicado na Éditions Gallimard em 1947, quer com esta obra quer com outras que o autor já tinha concluído em 1946, como sejam A Espuma dos Dias e «O Outono em Pequim». A primeira, uma história de amor trágica num mundo em que objectos banais interagem com as emoções das personagens, é agora considerada a sua obra-prima, ainda que à época tenha despertado pouco interesse. «O Outono em Pequim», que também gira em torno de uma narrativa amorosa, é um livro mais complexo mas tão-pouco obteve vendas favoráveis.

Aborrecido com o fracasso comercial dos livros, Boris jurou ser capaz de produzir um sucesso e em apenas duas semanas escreveu um romance cru acerca de crimes de natureza sexual e questões raciais, intitulado «Irei Cuspir-vos nos Túmulos». Servindo-se de um truque literário, imputou a autoria do livro a um fictício escritor americano chamado Vernon Sullivan, do qual Vian teria apenas sido o tradutor. Em seguida, convenceu um editor seu amigo a publicar a obra, em 1947. O artifício acabou por ser desmascarado, mas toda a agitação em redor do caso fez daquele um dos títulos mais vendidos do ano, motivando o autor a escrever três outros livros sob esse pseudónimo, entre 1947 e 1949.

O ano de 1946 tornou-se o ponto de viragem na existência de Boris Vian, já que numa das concorridas festas que este costumava organizar, em conjunto com Michelle, foi agraciado com a presença de Jean-Paul Sartre, Simone de Beauvoir e Albert Camus, tornando-se a partir daí um membro habitual desse círculo literário e publicando diversos textos na revista literária «Les Temps Modernes» editada pelos dois primeiros.

Vian admirava sobretudo Sartre, tendo-lhe atribuído um papel de relevo no romance A Espuma dos Dias, enquanto «Jean-Sol Partre». Não sem ironia, Sartre e Michelle iniciaram um caso amoroso, o que acabaria por destruir a união com Boris.

Apesar da carreira literária ganhar cada vez mais importância, este nunca abandonou os círculos musicais, contribuindo com frequência para revistas da especialidade e continuando a tocar trompete no clube de jazz Le Tabou. Tudo isto fez com que a respectiva situação financeira melhorasse substancialmente, permitindo-lhe abandonar o emprego na AFNOR.

Em 1948, nasceu a filha, Carole. O autor manteve presença na escrita através do pseudónimo Vernon Sullivan e editou duas colectâneas de poesia, incluindo «Cantilenas em Geleia», já em 1949. Começou também a escrever peças de teatro, a primeira das quais intitulada «L’Équarrissage pour tous», que foi a cena em 1950. Ainda nesse ano, publicou o terceiro romance importante, «A Erva Vermelha». Trata-se de um enredo muito mais pesado que os anteriores, centrado num protagonista que constrói uma máquina gigante para com o auxílio desta explorar a própria alma. Tal como os restantes dois em nome próprio, vendeu mal. A situação financeira estava já em declínio desde os finais de 1948 e Boris viu-se obrigado a fazer traduções a partir do Inglês (literária e jornalística) para se manter à tona. Divorciou-se então da mulher e em 1950 conheceu Ursula Kübler, uma bailarina suíça, iniciando um relacionamento com ela e casando em 1954.

O derradeiro romance, «O Arranca-Corações» foi publicado em 1953, de novo com pouco sucesso comercial, fazendo com que o autor desistisse enfim de escrever prosa. O único trabalho surgido depois dessa data é uma edição melhorada de «O Outono em Pequim», editada em 1956. Dedicou-se então à escrita de canções e à poesia. Obteve algum sucesso com a música e em 1954 deu início à primeira tournée como cantautor.

Ao longo do ano de 1955, tornou-se profícuo em múltiplos campos: escrita de canções, ópera, guiões de cinema e peças de teatro.

Nesse ano, Vian decidiu interpretar algumas das próprias canções em palco, desiludido com a recusa do cantor Marcel Mouloudji em levar a palco a mais recente música, receando que esta fosse banida à conta de algumas frases polémicas. Apesar de Boris ter aceitado modificar um verso, esta foi mesmo assim banida da televisão e rádio até 1967. Em geral, as actuações musicais de Vian só conquistaram verdadeiro sucesso dez anos após a sua morte.

Já em 1956, a saúde do autor sofreu duro golpe à conta de um edema pulmonar, mas este sobreviveu e manteve o ritmo de trabalho intenso. No ano seguinte, concluiu nova peça de teatro, só levada a palco dois anos depois. Em 1958, dedicou-se à criação de uma ópera e a uma colectânea de ensaios, publicada no mesmo ano.

Na manhã de 23 de Junho de 1959, Boris estava no Cinema Marbeuf para a exibição da versão cinematográfica de «Irei Cuspir-vos nos Túmulos». Tinha já discutido em momento anterior com os produtores acerca do conteúdo do filme e chegou mesmo a criticar o resultado publicamente, ameaçando retirar a autoria dos créditos finais. Poucos minutos após o início da sessão, terá resmungado: «É suposto estes fulanos serem americanos? Um ova!». Em seguida, colapsou na cadeira e morreu de ataque cardíaco fulminante, a caminho do hospital.

Enquanto foi vivo, só obteve sucesso comercial com as obras escritas sob o pseudónimo Vernon Sullivan. As outras, com verdadeira importância literária na opinião do autor e de outros escritores famosos, revelaram-se sempre um fracasso de vendas.

Obedecendo a um fenómeno comum, após a morte de Vian as obras A Espuma dos Dias, «O Outono em Pequim», «O Arranca-Corações» e «A Erva Vermelha» começaram enfim a receber a atenção devida e obtiveram sucesso entre as novas gerações dos anos 60 e 70.

Enquanto cantautor, o sucesso foi moderado. Ao decidir interpretar as próprias músicas, rejeitadas pelos artistas mais conceituados, convenceu apenas uma audiência limitada, sem que o grande público o reconhecesse.

Apenas a geração do Maio de 68 lhe concedeu verdadeira importância, seduzida pela irreverência das letras.

Ainda assim, pode gabar-se de ter inspirado Serge Gainsbourg, que tinha o hábito de escutá-lo no cabaret Les Trois Baudets e que terá afirmado, 30 anos depois:

Fiquei boquiaberto […], ele cantava coisas fantásticas […], foi ao ouvi-lo que decidi tentar fazer qualquer coisa de interessante.

Com os anos, as obras de Boris Vian atingiram o estatuto de clássicos modernos, sendo elogiadas com frequência e alvo de estudo nos currículos escolares.

O autor é visto, ainda hoje, como um símbolo do meio artístico e intelectual parisiense do pós-guerra.


Romance publicado em 1947. Embora se trate de uma narrativa linear, esta contém vários enredos (relacionamento de dois casais) e alguns elementos de cariz surrealista (ratos falantes e um homem que envelhece numa semana o equivalente a vários anos). A história principal é acerca de um protagonista recém-casado, cuja mulher desenvolve uma doença complexa e rara, para a qual o único tratamento é ser rodeada de flores.

A Espuma dos Dias serviu de inspiração para três filmes, dois álbuns musicais e uma ópera.

 

Enredo

 

Num mundo alternativo de contornos surrealistas, onde animais e objectos inanimados reflectem as emoções humanas, encontramos Colin, um jovem abastado cujo quotidiano é auxiliado por um empregado particular cheio de estilo e recursos, chamado Nicolas e um amigo leal de nome Chick. Apesar da enorme fortuna, que lhe permite um estilo de vida exuberante, Colin está ansioso por encontrar uma companheira, chegando ao ponto de mostrar proibido interesse pela namorada de Chick, Alise. Tão grande desejo contribui para que se apaixone sem dificuldade por Chloe, uma jovem rapariga que conhece na festa de outra amiga. Após curto e intenso namoro, estes casam-se, numa cerimónia espampanante. Num gesto que pretende nobre, Colin oferece um quarto da sua fortuna a Chick e Alise para que também eles se possam casar, apesar das hesitações do primeiro.

No decorrer da lua-de-mel, Chloe é de súbito acometida por uma doença misteriosa, cujos sintomas principais consistem em tosse e dores no peito, situação que os obriga a terminar a viagem abruptamente. Após o regresso, esta aparenta melhorias, mas sofre de imediato uma recaída e desmaia durante uma ida às compras, por entre ataques de tosse.

O diagnóstico revela a presença de um nenúfar no pulmão, uma doença rara e dolorosa cujo único tratamento consiste em estar sempre rodeada de flores. Tal obriga a despesas enormes e não demora muito até Colin esgotar as poupanças, vendo-se obrigado a aceitar empregos menores e mal pagos, numa desesperada tentativa de sustentar o tratamento de Chloe. À medida que a doença progride, os apartamentos de Colin, Chick e Nicolas começam a exibir sinais de decadência e este último envelhece numa única semana o equivalente a vários anos.

Entretanto, a obsessão de Chick pelo trabalho de um filósofo, Jean-Sol Partre, faz com que este empenhe fundos, esforços e atenção no acto de coleccionar todas as obras desse autor. Alise, ressentida com o desprezo de Chick em favor daquela interminável colecção de livros, planeia salvar as finanças e rejuvenescer o interesse dele por ela, tentando convencer Partre a deixar de publicar. Quando o autor recusa, Alise mata-o. Em seguida, numa odisseia vingadora, assassina todos os livreiros que normalmente vendem as obras do filósofo e incendeia as respectivas livrarias. Em simultâneo, Chick é alvo de uma visita inesperada por parte de agentes da autoridade, que o acusam de evasão fiscal e contrabando de tabaco. No seguimento da altercação, este recusa entregar a dita colecção de livros como pagamento da multa correspondente e acaba por morrer, vítima do disparo involuntário de um dos agentes no local.

Por fim, o esforço de Colin para rodear Chloe de flores revela-se infrutífero e o desgosto após a morte dela é tão forte que até o ratinho de estimação comete suicídio, incapaz de suportar o ambiente pesado que se instala.

 

Personagens

 

 – Colin – Protagonista do romance. De personalidade afável, com meros 22 anos é já dono de uma considerável fortuna, contexto que lhe permite viver sem trabalhar e investir em variados luxos. Numa fase inicial, demonstra alguma inveja da relação amorosa entre Chick, o seu melhor amigo e Alise, sonhando com algo semelhante. Em breve, porém, resolve o caso ao envolver-se com Chloe, que conhece numa festa organizada por Isis, outra amiga. O seu carácter generoso e impulsivo fica demonstrado através da sua extemporânea decisão de casar com Chloe, muito pouco tempo depois de se conhecerem. No final, fica completamente devastado com a morte prematura da mulher.

 

 – Chloe – Namorada e depois mulher de Colin, apresentados pela amiga em comum, Isis. Apaixona-se rapidamente por ele e aceita casar-se no seguimento de um curto e intenso namoro. No decorrer da lua-de-mel, é acometida por uma estranha doença – um nenúfar no pulmão – e a única hipótese de cura é estar sempre rodeada de flores. Apesar dos esforços desesperados do marido, a situação degrada-se de forma célere e esta acaba por morrer, para grande desgosto do companheiro. Personagem baseada na primeira mulher do autor, Michelle.

 

 – Chick – Melhor amigo de Colin, de temperamento cordial. Engenheiro de profissão, é incapaz de atingir o estatuto financeiro exibido por Colin. Apesar disso, passam bastante tempo juntos, em jantares e outros eventos. Mantém um relacionamento com Alise, com quem deseja casar, apesar de preocupado com a situação financeira e a opinião dos futuros sogros. Com o tempo, desenvolve uma perigosa obsessão pela obra de um filósofo, Jean-Sol Partre, que o faz desperdiçar todo o orçamento na colecção de livros do mesmo. É vítima de um final trágico, ao morrer às mãos de um polícia, durante uma altercação com as autoridades acerca de eventuais crimes de evasão fiscal e contrabando de tabaco, por se recusar a entregar como pagamento da multa a colecção de livros de Partre.

 

Nicolas – Empregado particular de Colin, com 29 anos de idade. Dedicado, diligente e prático. Respeitado pela qualidade dos cozinhados mas também pela grande inteligência. Tio de Alise. À medida que a doença de Chloe se agrava, envelhece vários anos no espaço de uma semana.

 

 – Alise – Namorada de Chick, com 18 anos. Conheceram-se numa das palestras de Partre. Fica progressivamente frustrada com a relutância dele em casar com ela e depois com a obsessão que este revela pela obra de Partre, contexto que o torna cada vez menos presente. Por fim, mergulha numa odisseia de crimes, ao não conseguir convencer Partre a deixar de publicar.

 

 – IsisSocialite de apenas 18 anos, amiga dos restantes e anfitriã da célebre festa onde Colin e Chloe se conhecem e apaixonam. É também namorada de Nicolas.

 

 – Jean-Sol Partre – Filósofo e autor das obras pelas quais Chick fica obcecado, gastando fortunas na respectiva colecção. Trata-se de uma versão ficcionada do filósofo Jean-Paul Sartre, com quem Michelle Vian tem um caso extraconjugal.

 

É prevalecente a teoria de que a doença de Chloe simboliza a generalidade dos cancros terminais, embora também se defenda um eventual paralelismo entre esta e a crónica doença cardíaca de que padecia o autor.

Os enormes gastos financeiros de Colin no tratamento de Chloe e a sua incansável busca por trabalhos que representem um acréscimo de salário equivalem à batalha financeira que muitas famílias são obrigadas a travar para assegurar os tratamentos dos familiares. O desespero para manter a mulher viva e o posterior desgosto e depressão com a morte dela encontram igualmente paralelo nos sentimentos de todos os que perdem familiares ou amigos para doenças terríveis.

Em resumo, o comportamento e destino de Colin demonstram com facilidade que tais casos devastam não só a vida dos pacientes mas também a de quem os rodeia.

Por outro lado, a obsessão incontrolável de Chick pela obra de Jean-Sol Partre é uma metáfora para a toxicodependência, comprovada pela galopante negligência de Alise e pelo desperdício imparável dos recursos financeiros – traços comuns entre os viciados.

A deterioração tangível dos apartamentos de Colin, Nicolas e Chick reflecte a depressão e gradual desesperança entre todos, provocada pelo avançar da doença. O súbito e radical envelhecimento de Nicolas resulta também desse contexto traumático.

Jean-Sol Partre é um jogo de palavras humorístico com o nome do filósofo existencialista Jean-Paul Sartre. Surgem diversas referências a obras deste ao longo do romance, mas Vian serviu-se do mesmo estratagema, brincando com as palavras para inventar novos «títulos».

O romance foi descrito por alguns enquanto obra «louca, tocante e bela». Outros afirmaram tratar-se de:

Um grande romance, recheado de ambiguidades, divagações e níveis de significado. E nem sequer níveis muito obscuros, já que estes surgem à superfície constantemente. Trata-se de certa forma de um romance construído a partir de erupções.

Embora alguns críticos censurem o facto de o autor «contribuir, com o seu estilo inspirado no absurdo, para uma certa distância emocional», logo admitem que «os capítulos finais da obra exibem um ambiente de profunda tristeza, dois casais arruinados pela mortalidade, obsessões intelectuais e ambições sufocantes».

Hoje, considera-se que a obra «funciona em diversos planos, tornando a sua leitura algo mais do que um entretenimento – sendo antes uma iniciação ao modo como Vian encara a realidade, por si só uma experiência poderosa».

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